MARIA INÊS SAMPAIO BARREIROS
A vida dá grandes voltas e, no seu movimento, acontece
que muitas vezes até nos troca as voltas. É o caso da nossa entrevistada deste
mês, que conheceu muitas dificuldades mas que sempre lutou para vencer as
contrariedades que ia enfrentando.
“Nasci aqui na nossa então vila, no dia 25
de Setembro de 1931,numa família com quatro filhos (dois rapazes e duas
raparigas), dos quais só eu e a minha irmã estamos vivas. Toda a nossa infância
foi passada na Ruinha, onde a família morava.”
Vivendo perto de uma escola,
certamente que foi mais fácil frequentá-la. Certo?
“Não. Nessa altura as aulas não eram mistas
pelo que, vivendo perto de uma das escolas, fui para a Conde de Ferreira,
frequentada apenas por raparigas. No entanto, da escola só me lembro de ir para
lá com uma mala de pano, mas apenas por poucos dias, o que não deu para
aprender a ler ou a escrever. Fiz apenas uns gatafunhos.”
Mas por que razão não andou mais
tempo?
“Os tempos eram bastante difíceis. O meu
pai, José Maria Afonso Barreiros, era na altura empregado do sr. Manuel do
Alberto, que tinha umas carroças com que fazia o transporte de vários tipos de
carga e, portanto, ganhando pouco, havia mais a preocupação de se arranjar
sustento para a família do que dar instrução aos filhos. O meu pai, que em
jovem tinha aprendido música, era também filarmónico na Carlista. Mais tarde
foi para contínuo do tribunal, ainda este estava instalado no que é hoje a
biblioteca municipal.”
Então, ainda novinha e sem
escolaridade, como se ia desenvolvendo a sua vida?
“Por volta dos 9/10 anos, com umas
sapatilhas de trapo, que usava quer fosse verão, quer fosse inverno, trabalhava
fazendo recados a quem calhava e até lavava o chão da casa de uma vizinha.
Ganhava muito pouco, mesmo atendendo a esses tempos. E assim ia sendo a minha
vida, fazendo os trabalhos que me apareciam. Até que, já perto dos 20 anos,
comecei a ter outros serviços mais permanentes. Estive em casa do sr. Gaspar
Ferreira e do dr. Vacas de Carvalho com uma certa regularidade, ainda que fosse
aceitando outros trabalhos ocasionais que me iam aparecendo.”
Propomos
agora um salto no tempo para trazer novas recordações
“Teria
perto de trinta anos, e depois de um namoro atribulado porque os meus pais não
eram favoráveis, juntei-me com o meu namorado, de nome Manços Calhau, que era
ardina e contínuo do União, quando a sua sede era ali na rua Capitão Pires da
Cruz. Foi ele o pai das minhas duas filhas, uma das quais faleceu ainda não há
muito tempo. O Manços morreu ainda as minhas filhas eram pequenitas e, dada a
minha situação ser bastante difícil, fui forçada a interná-las no Asilo de
Infância, gerido por freiras e situado no Convento da Saudação, no Castelo. Por
lá estiveram alguns anos. Entretanto, há perto de 50 anos, juntei-me com João
Francisco Salgueiro, com quem mais tarde me casei oficialmente. Foi ele que
tomou a iniciativa de retirar as minhas filhas do Asilo. Do João não tive
filhos, mas tratou sempre as minhas filhas como se dele fossem.”
Então,
a partir daí, a sua vida melhorou…
“Passei
por grandes desgostos e sofri muito com uma vida de sacrifícios, de
contrariedades e de trabalho penoso, porque o pai das minhas filhas ganhava
muito pouco. Só anos depois, quando primeiro me juntei e depois casei com o meu
actual marido é que a minha vida melhorou. O João foi operário da construção
civil e empregado da Gelmar. Quando esta empresa encerrou, ele emigrou para a
Alemanha e, passados alguns meses, também eu fui ter com ele. Passámos lá
poucos anos, sempre com o medo atrás da porta, porque então ainda não estávamos
casados e eu não tinha contrato de trabalho nem autorização de residência.”
Mas
ainda deu para amealhar algum dinheirito?
“Sim,
apesar de não ser muito. De qualquer forma, ainda nos permitiu adquirir a
nossa casita na rua Teófilo Braga, ou seja, na rua Direita. Foi comprada à
Família Cunhal e depois o meu marido, que já havia sido pedreiro, fez lá dentro
uns melhoramentos que a tornaram na nossa habitação. Neste momento, o meu
marido ainda lá vive, sozinho, desde que no dia 10 de Maio deste ano entrei
para o Abrigo.”
E
o que a levou a optar por vir para o Abrigo?
“Como
vê, desde há muito tempo que sofro imenso de artroses, que me atormentam cada
vez mais as mãos e as pernas. Esta situação incapacita-me para realizar as
tarefas mais essenciais. Andei de médico para médico mas nada resultava. Sem
conseguir efectuar as tarefas mais indispensáveis, fui forçada a pedir ajuda ao
Abrigo. Quando entrei ainda me movia com duas canadianas mas, passado pouco
tempo, talvez cedo demais, puseram-me numa cadeira de rodas e até assim tenho
de ser ajudada para me deslocar. Vou frequentemente ao ginásio, mas continuo a
ser dependente porque nem sequer tenho força nas mãos para mover a cadeira.”
E
o seu marido?
“Está
lá na nossa casa, até que haja vaga para se juntar a mim, porque também não
está bem. No entanto, enquanto a tal vaga não surge, o Abrigo proporciona-lhe o
“Apoio Domiciliário”.
Resta-nos
endereçar a todos os(as) Utentes das três áreas sociais, aos Funcionários (as),
aos Membros dos Corpos Sociais, ao Corpo Médico e de Enfermagem, aos
Colaboradores (as) e aos nossos Leitores(as) os mais sentidos votos de um FELIZ
NATAL e de um ANO de 2018 sobretudo com Saúde!