DELFINA DA CONCEIÇÃO AMARO DE CARVALHO
Nunca
casou, mas esse facto não foi impeditivo para trazer ao mundo quatro
descendentes. A D. Delfina tem hoje 79 anos e é utente do Abrigo dos Velhos
Trabalhadores por incapacidade física. Não foram precisas muitas palavras para
nos contar a sua história de vida, que aqui reproduzimos:
“Nasci
na aldeia de Nossa Senhora de Machede, filha única de Leonel Rego de Carvalho e
de Guiomar da Conceição Amaro. O meu pai trabalhava para vários patrões e em
diversas localidades. Era “cavalista”, isto é, ensinava cavalos. Os meus pais
separaram-se após um ano de casamento, ou seja, cerca de um mês depois de eu
ter nascido. A partir daí fui criada pela minha avó materna, naquela aldeia,
até aos vinte anos.”
Mas não andou à
escola?
“Andei
e fiz a 3ª classe, após o que, com 11 anos, comecei a trabalhar no campo.
Primeiro a apanhar azeitona e depois mondei, ceifei, plantei arroz e fiz
praticamente todos os trabalhos agrícolas. Isto, como já disse, até aos vinte
anos, altura em que vim para Montemor para casa da minha mãe, que aqui morava.
Apesar de até então ter vivido com a minha avó, nunca deixei de me dar com a
minha mãe. Por outro lado, o meu pai, que nunca deu a mínima ajuda à minha avó,
só muito raramente o vi.”
E depois de estar
em Montemor com a sua mãe, continuou a trabalhar no campo?
“Não.
Empreguei-me na Azinhex, que fabricava tacos de azinho para soalhos, onde
estive dez anos, até a firma fechar. Entretanto, mesmo enquanto estive na
Azinhex, aos fins de semana ainda ia fazendo outros trabalhos no campo.”
E depois de ter
ficado sem aquele emprego?
“Arranjei
trabalho em casa do comerciante sr. Manuel Maria Cidade, ali na antiga rua da
Parreira, hoje rua Germano Vidigal. Fazia a limpeza da casa e tratava da sua
alimentação. Foram estes dois empregos que me valeram mais tarde, porque em
qualquer deles descontava para a Caixa de Previdência e, portanto,
garantiram-me uma pequena reforma.”
Mas ainda não nos
falou do nascimento dos seus filhos, uma vez que já declarou que nunca foi
casada…
“Primeiro,
vivi maritalmente com António da Costa Tendeiro, natural de Alpiarça, de quem
tive dois filhos – o António Luís e a Guiomar. Mais tarde tive duas filhas
(Almerinda e Céu) de outros dois homens com quem vivi, um de Montemor e outro
de Abrantes. Mas nunca fui casada. Estes quatro filhos viveram sempre comigo e
hoje tenho 8 netos e 15 bisnetos.”
Entretanto, chegou
a altura da reforma…
“Sim.
Reformei-me, por doença, com quarenta e poucos anos. As minhas plaquetas
acusavam valores extremamente baixos “5”, o que me incapacitava praticamente
para tudo. Provocava-me um enorme cansaço ao menor esforço e sangrava do nariz
com frequência e abundantemente. As minhas pernas estavam muito feridas e com
dificuldades de cicatrização. Mais tarde fui operada ao baço, depois aos
intestinos e há pouco tempo a um joelho. Deixei de andar e agora só me desloco,
e mesmo assim com dificuldade, numa cadeira de rodas.”
Reformando-se tão
cedo, doente e com a reforma certamente baixa, deve ter passado por algumas
dificuldades.
“Tanto
os meus filhos, netos e bisnetos sempre me trataram bem. Inicialmente nem
precisava da sua ajuda, não porque eles a negassem mas porque a reforma ia-me
dando para viver. Porém, depois da operação aos intestinos, já lá vão sete
anos, comecei a viver em casa da Céu e do marido, onde dormia e comia. Foram
sempre muito bons para mim, tal como o meu neto. Aliás, salvo uma excepção,
todos os meus filhos e netos sempre foram impecáveis comigo. Ainda hoje, quando
ao fim do dia saio do Abrigo, porque por enquanto estou aqui apenas no “Centro
de Dia”, é na casa da Céu que eu vou dormir.”
Se bem que só aqui
esteja há pouco mais de um mês, como tem sido a experiência?
“Estou
satisfeita. Sou muito bem tratada e não tenho a menor razão de queixa seja de
quem for. Passo os dias a conversar com as amigas, a ver televisão e a
aproveitar o sol lá na varanda.”
Obrigado pela sua
atenção D. Delfina. Que vá continuando a sentir-se bem.