JOAQUIM
RAFAEL MARTINS
Vai
completar 92 anos no próximo mês de Abril, mas ainda lhe surge um brilhozinho
nos olhos quando evoca os seus tempos de juventude e os bailaricos que, nos
mais diversos locais da sua zona de residência, eram frequentes quase todos os
fins de semana. Está casado há 67 anos com Margarida Augusta Ladeiras. Não
tiveram filhos. Estão como residentes do Abrigo há cerca de 5 anos.
Nascido
no Monte Novo, ali perto dos Cavaleiros, o sr. Joaquim Rafael Martins recorda algumas fases da sua vida.
“Sempre
vivemos no campo. O meu pai explorava uma pequena parcela de terra que era
nossa e trabalhava noutras que arrendava. Na idade apropriada andei à escola,
não numa oficial mas numa casa grande onde uma senhora, salvo erro de nome
Maria Emília, vivia com os pais e dava aulas a uma dúzia de crianças dos
arredores, certamente que a troco de qualquer “milhadura”. Ainda frequentei a
terceira classe, mas estou em crer que não fiz qualquer exame. Ainda hoje vou
lendo, mas na escrita tenho mais dificuldades.”
E acabada a
escola, houve que começar nova fase na sua vida:
"Teria
uns doze anos comecei a trabalhar no campo, juntamente com o meu pai. Fiz
praticamente de tudo, tanto na nossa terra como na da D. Antónia Padeira, que o
meu pai trazia de renda. Ainda me recordo de ir ali a uma casa, com a frontaria
de azulejos, em frente da Igreja da Sra da Luz pagar os 8 contos que era o
valor anual da renda. Isto para além da pitança, que no caso em concreto se
tratava de 3 galinhas e 1 peru, que eu, de carroça, ia levar ao monte de Vale
de Nobre.”
E era chegada a
altura que toda a juventude conhece…
“A
minha juventude foi bem aproveitada. Ali pelas Fazendas, raro era o Sábado em
que não havia funçanada. Nem queira saber o que eram aquelas festanças. Bastava
haver um rapaz que desse uns toques de concertina e estava o baile armado. Pelo
Carnaval, então, aquilo era uma festa pegada. Agora até mete pena. Está tudo
praticamente desabitado. Há muitos montes vazios. É um dó de alma.
E era nesses
bailaricos que se arranjavam os namoros...
“Claro. Com 18/19
anos comecei a namorar a que haveria de ser a minha mulher. Pelo meio ainda
namorisquei outra rapariga, mas acabei por voltar à mesma. Então, tinha eu 24
anos e a Margarida 22, um belo dia juntámos os trapinhos. Mas a D. Antónia não
consentia ninguém na propriedade que não estivesse legalmente casado, pelo que
tivemos de oficializar o casamento pelo Registo e pela Igreja.”
E já com o novo
estatuto mantiveram-se por lá muito tempo?
“Nem
por isso. Já casados, fomos morar para o Monte do Passa Figo, onde permanecemos
34 anos. Passado este tempo a Senhora vendeu a propriedade ao sr. Luís Torres
e, então, tivemos de nos mudar. Regressámos ao meu lugar de origem – o Monte
Novo – e por aqui ficámos cerca de 30 anos.”
E sempre a
trabalhar no campo?
“Sim,
senhor. Fiz praticamente todos os trabalhos na agricultura e também trabalhei
em carvoarias, desde cortar e preparar a lenha, “terrear” os fornos e, depois
do carvão estar pronto, retirá-lo e ensacá-lo. Levei uma vida de trabalho, mas
calmo, sem grandes alterações.”
E agora?
“Sou
muito nervoso, mas de resto pessoalmente não tenho sido muito massacrado. A
minha mulher, essa sim, tem sido uma vítima das doenças. Praticamente
incapacitada devido a reumatismo nas mãos e nos pés, ultimamente ainda lhe
apareceu mais uma qualquer doença que a obriga a alimentar-se através de uma
sonda."
Então, como vai
passando os dias?
“Ultimamente não
tanto, devido ao estado de saúde da minha mulher, mas participava nas actividades
que aqui se vão fazendo. Só este ano é que não desfilei pelo Carnaval. Fui
algumas vezes nas visitas que o Abrigo organiza mas, pelo mesmo motivo, agora
não tenho ido. Já agora, vou contar-lhe um pormenor curioso: Entrei para o
Abrigo numa segunda-feira de Entrudo e, mal cheguei, fui logo metido ao barulho
pelo Zé Manel e pela D. Céu, que me convidaram a entrar com o pé em dança. E eu
não me fiz rogado.
Felicidades, Amigo
Joaquim e os votos de melhoras para a sua Esposa.