quarta-feira, 27 de agosto de 2014

O ABRIGO E A FEIRA DA LUZ



Mais previsível que o bom tempo em Agosto ou a subida próxima dos salários e pensões, é a realização, em Setembro de cada ano, da nossa “Feira da Luz”, velhinha mas sempre renovada.
Assim, de 3 a 8 do próximo mês são muitos e apetecíveis os motivos que irão levar milhares de pessoas ao Parque de Exposições e Feiras.

Para além dos tradicionais divertimentos, imprescindíveis em certames deste tipo, das barraquinhas de comes-e-bebes, e das atracções já anunciadas (Rita Guerra, Richie Campbell, Noite de Fados com Hélder Moutinho, Noite de Folclore, “Os Azeitonas” e Sérgio Godinho, e outros que a seu tempo se conhecerão) a desfilarem sucessivamente em cada dia nos palcos do recinto, teremos também os inúmeros pavilhões que mostram a diversidade de associações, grupos, empresas e produtos regionais que contribuem para o desenvolvimento comercial, industrial, recreativo, cultural, desportivo e social do nosso concelho.



Pois bem: Perante esta realidade, o ABRIGO DOS VELHOS TRABALHADORES não poderia, de forma alguma, alhear-se do evento e, como já vem sendo tradicional, lá estará com um pavilhão, demonstrativo da vitalidade participativa dos seus utentes e colaboradores.
Das mãos habilidosas das nossas e dos nossos utentes, lá teremos expostas magníficas peças de artesanato, concebidas em diversos materiais, que revelam elevado sentido artístico.

E quem visitar o nosso pavilhão terá ainda mais uma oportunidade soberana de adquirir o livro intitulado " Para a História da Assistência em Portugal - Do Asilo de Mendicidade ao Abrigo dos Velhos Trabalhadores de Montemor-o-Novo - 1914/2014", da autoria da historiadora Dra. Teresa Fonseca.
O livro, e segundo a sua autora, aborda a origem da instituição, fundada em 1 de Janeiro de 1914 com o nome de Asilo de Mendicidade, e traça a sua evolução posterior até à transformação na que é hoje a Associação Protectora do Abrigo dos Velhos Trabalhadores.
Pois são estes 100 anos da história local que lhe propomos. O livro tem um custo pouco mais que simbólico e permitir-lhe-à ficar a conhecer pormenores interessantes por que passou esta Instituição ao longo de um século. Não perca.

E o que dizer então das simpáticas rifas? Sem ser necessário efectuar telefonemas, como aqueles com que alguns canais de televisão massacram constantemente os espectadores, poderá ser de imediato contemplado com um prémio útil. E se não tiver a sorte de sair daquela vez, é sempre conveniente tentar de novo porque, pelo menos, resta-lhe a compensação de saber que contribuíu para uma obra de solidariedade social que prestigia a nossa terra.

Mas pode ainda observar, nas paredes do pavilhão, um conjunto de fotografias que mostram vários aspectos da nossa realidade, desde o dia-a-dia dos utentes, às actividades de animação sócio-cultural, aos passeios, à colónia de férias e a outras realizações que merecem uma apreciação atenta.

E se de alguma forma ficou sensibilizado com o que viu, aqui fica uma sugestão: faça-se sócio do Abrigo. É barato e ajuda uma instituição que agora precisa de si e, quem sabe, no futuro lhe poderá ser útil…

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

OS NOSSOS UTENTES

FRANCISCO  BALTAZAR  CHARNECA  TIRA-PICOS


Com 80 anos feitos no passado dia 25 de Junho, o nosso entrevistado deste mês prestou-se de bom agrado a falar para a nossa página e, ainda que parco em palavras, lá nos foi contando os principais momentos da sua história de vida.
 “Sou viúvo, ainda não há um ano, de Maria de Jesus Ganso Ribeiro, com quem estive casado durante mais de meio século. Entrei para o “Centro de Dia” do Abrigo no dia 10 de Outubro de 2013, juntamente com a minha esposa que, infelizmente, pouco viria a beneficiar desta situação, porque faleceu no mês seguinte.”

Mas comecemos então pelo princípio:
 “Nasci no Sabugueiro, concelho de Arraiolos, onde sempre vivi, exceptuando os períodos em que os meus pais tiveram de se deslocar para outras paragens onde conseguiam trabalho.”
A escola foi sempre uma miragem, que nunca passou disso mesmo:
 “Ainda com pouca idade, os meus pais foram morar para os Foros da Branca, perto de Canha, onde não havia escola e, portanto, nunca a frequentei. Em vez disso comecei a guardar gado teria 8 ou 9 anos. A partir daí fui lançado no mundo do trabalho e o saber ler e escrever deixou de ser prioridade.”

Os anos foram passando e…
 “Mais tarde, teria para aí os meus 17 anos, fui trabalhar na lavra do arroz na herdade da Represa, onde o meu pai era o arrozeiro, mas eu fazia também os mais variados trabalhos agrícolas.”

Novo salto na sua vida:
 “Em 1955 fui para a tropa. Assentei praça em Estremoz e tempo depois mandaram-me para a Manutenção Militar, em Évora. Daqui regressei a Estremoz e passado um ano e meio fui desmobilizado e enviaram-me para casa.”

E voltou à vida antiga:
 “Sim, e à herdade da Represa, para a faina do arroz que, de uma maneira geral, me ocupava praticamente de Janeiro até Setembro, com interregnos para acudir à ceifa dos outros cereais. Claro que, livre da tropa e com trabalho mais ou menos garantido, comecei então a pensar em termos de futuro, porque não queria continuar na dependência dos meus pais.”

E agora, sim, surgiu a grande decisão:
 “Já antes de ir para a tropa eu namorava com a rapariga que eu sabia que, logo que estivesse livre da obrigação militar, viria um dia a ser a minha mulher. E assim aconteceu. Casámos ou, mais propriamente, juntámo-nos, e fomos morar para o Sabugueiro. Deste enlace nasceram quatro filhos, mas uma menina morreu passados poucos dias. Neste momento, portanto, tenho dois filhos (um mora em Sabugueiro e outro em Arraiolos) e uma filha que reside aqui em Montemor. São todos casados.”

Apesar do namoro não ter sido contrariado pelos pais, mesmo assim nesses tempos a vida não era fácil para os namorados:
 “Quando nos começámos a namorar, trabalhávamos ambos na Represa. Tinhamos de arranjar a maneira de nos encontrarmos no caminho de regresso a casa, mas com o cuidado de nos separarmos quando já estávamos perto da aldeia, porque era impensável sermos vistos juntos fora de portas. Só me era permitido falar com a minha namorada numa janela mais alta e, mesmo assim, com a mãe a vigiar. Parecido com o que se passa agora, não é ? O que dantes era de menos, agora é de mais.”

Mas, é claro, também iam a divertimentos.
 “Fomos algumas vezes a bailes no Sabugueiro, em S. Pedro da Gafanhoeira ou nalguns montes ali à volta. Isto num tempo em que as namoradas iam sempre acompanhadas, sobretudo pelas mães, para que não pusessem o pé em ramo verde. Já agora, e a propósito destes bailaricos, deixe-me contar-lhe um episódio que nunca mais esqueci. Uma vez, num monte perto de S. Pedro, organizou-se um baile com um tocador de harmónio, como era normal. À entrada da casa havia um poial com potes e cântaros com água. Ora como o pessoal era muito e a casa era pequena os empurrões sucediam-se e, a dado momento, um dos homens que por ali estava não conseguiu evitar e foi contra os cântaros, que se partiram. Foi o princípio de uma enorme zaragata. Envolveu-se tudo à pancada e à pedrada e já ninguém se entendia. Não tive outro remédio que não o fugir para evitar a confusão ou levar com alguma pedra transviada.”

Segundo nos confessa, é bem tratado no Abrigo e não tem razão de queixa seja de quem for:
 “Integrei-me bem no espírito da instituição e já fiz parte de algumas iniciativas que aqui se fazem para tornar mais agradáveis as nossas horas. Fiz teatro, entrei no coral, vou às piscinas municipais e não me escuso a ir dar os meus passeios, dos quais destaco as idas ao Fluviário de Mora e ao Palácio de Vila Viçosa. Como já disse, toda a gente me trata bem, mas sem desprimor para as restantes, gostaria de salientar o papel da D. Céu, que é realmente uma pessoa extraordinária.”

A nossa conversa chegava ao fim, mas ficámos com a certeza de que muito ficou por revelar pelo nosso amigo Tira-Picos. Fica para uma próxima oportunidade.